Eu posso até não me lembrar o dia exato da morte de Amy Winehouse, mas sei te dizer exatamente onde eu estava e o que eu estava fazendo no momento em que vi, em algum canal de TV pago, um jornalista comentando sobre o acontecido. Não vem ao caso onde ou como foi isso, o que importa é que, por algum motivo, aquilo ficou registrado em mim.
Não posso dizer que eu sou fã, embora vez ou outra passasse horas e horas ouvindo algumas das músicas e cantando desafinada e erroneamente. A primeira música dela que me lembro de ter ficado ouvindo no repeat do computador foi Stronger than me.
Então, ontem à noite, quando Lari e eu resolvemos assistir ao documentário sobre a cantora (parte do nosso desafio pessoal e interno de assistir à todos – ou uma grande parcela – dos filmes que estão concorrendo ao Oscar, em qualquer que seja a categoria) e essa música começou a tocar, foi como estar de volta à alguns momentos (bons? ruins? tensos? ainda não consegui descobrir!).
Amy Winehouse ficou famosa pela música diferenciada em meio à quantidade de pop chiclete que era (e ainda é) comercializado, pelo timbre e, acredito eu, pelo estilo pessoal. Ao contrário de muitos artistas e aspirantes que vemos por aí, Amy parecia ser realista. Sabia que todo bônus tem seu ônus e, no caso da fama, poderia ser tão grande quanto assinar o próprio atestado de óbito.
Bem no comecinho do doc, há um áudio de uma entrevista – se não me engano – na qual ela fala sobre a fama e sobre ela não conseguiria lidar com a fama, com a possibilidade de todo mundo (ou em todo o mundo) ficar sabendo de cada passo que ela dá. A perda da privacidade. (Rápido flash foward para depois de assistirmos ao filme: eu e Lari ficamos conversando sobre isso, por um tempo. Ao ponto que, em determinado momento, nós acabamos falando sobre como alguns artistas acabam por “se isolar” na tentativa de ter um pouco de privacidade e sobre como as pessoas precisam saber respeitar esse espaço, esse momento. Não é porque a pessoa é famosa que ela não tem direito a ficar de cara feia, não querer conversar e/ou tirar uma foto.)
O documentário acompanha Amy desde antes da fama, com gravações caseiras (o que nos levou à outro assunto: aqui no Brasil nós não temos muito esse costume de fazer filmagens de coisas cotidianas, né?! Quer dizer, atualmente, com celulares é bem mais fácil, mas lembro que quando eu era pequena as filmagens que nós temos são só dos aniversários (e olhe lá!). (Fora que parece que perdia a “graça” da brincadeira: era aquele fuzuê quando alguém comprava uma câmera nova, mas passados uns 3 ou 4 meses, ela só saía do armário se fosse um evento importante. Nada de registrar o primeiro suspiro/passinho/palavra da criança!).
Eu nunca tinha, verdadeiramente, parado para pensar sobre as músicas. Não sabia das histórias por trás, exceto de Rehab porque, né, quem não?! (soube, no caso) Mas ouvindo agora, depois de tudo isso, faz muito mais sentido. Como Back to black é aquele hino do fim de namoro, da fossa ferrada (ela, inclusive, conta que nessa época ela mal saía da cama e só queria beber e dormir o tempo todo!); Love is a losing game, sobre o coração estar estraçalhado no chão e você não ver uma única saída possível; e, claro, Rehab a música que tocou doze bilhões de vezes quando foi lançada e todo mundo sabia cantar (mas acho que poucas pessoas realmente pararam para pensar no que estava sendo cantado).
Amy subiu, muito e muito rápido. Gravou dois cds em estúdio, se envolveu com o cara errado, teve o coração partido, não teve limites, não teve ajuda. O mais apertado do documentário é isso. As pessoas que deveriam estar lá para ajudar, achavam que estava tudo bem. “Ah, ela tem comportamentos bulímicos, mas tá tudo bem.” “Oh, ela tem abusado de álcool. Tudo bem, ela sabe melhor do que isso!” E, como se não bastasse, a cereja em cima do bolo, um pai que não parecia estar lá muito (para não dizer nem um pouco) preocupado com a própria filha. A filha recém saída da reabilitação, a filha que apresentava mil quatrocentos e doze comportamentos nocivos, e a filha que disse – com todas as palavras – que não queria, não se sentia bem o suficiente, para fazer certas coisas.
No último show mostrado no documentário, em um festival na Sérvia, Amy parece uma criança contrariada. Pede para sair do palco, mostra que não quer cantar e, por fim, quando fica frente a frente com o microfone, bate o pé. Ela é vaiada. Amy deveria cantar as músicas de Back to Black, o segundo cd, aquele que ela escreveu sobre o término com o cara que viria a ser seu marido (e, diga-se de passagem, seu passaporte para uma coisas bem pesadas), Blake Fielder-Civil.
Em uma das entrevistas do documentário, o entrevistador compara Amy à Dido, comentando que ambas fazem músicas autorais sobre “corações partidos”. Fosse alguns anos mais tarde, não duvido que a comparação teria sido com Adele (comparação, esta, que me parece um tanto mais próxima e sensata, musicalmente falando).
Acho que, por não ser tão fã, o documentário pareceu se arrastar um pouco, pra mim. Nada exaustivo, mas pouco dinâmico. Ele não hesita, nenhuma vez, em mostrar como a mídia foi ativamente culpada pela morte prematura da cantora (e como ela teria sido uma espécie de Lady Di). Amy não tinha estrutura física, emocional ou suporte para lidar com o frenesi da carreira, com a constante exposição e com toda a pressão. Ela sabia disso desde o início, mas ela não tinha limites.
Eu não chorei (e eu sou chorona), não fiquei com o coração pesado nem coisa do tipo. Mas fiquei cansada (dessa vez não pelo ritmo do doc, mas pelo conteúdo). Quis dormir logo em seguida para ver se ficava mais fácil de processar algumas das informações. De processar como, enquanto ela estava em reabilitação as pessoas (e estou falando de recortes de mídia que são exibidos) conseguiam ser extremamente maldosas e fazerem piadas, insinuações e achar que está tudo bem. Daí eu lembrei que na “vida real” também é assim. Uma pena. Talvez nós tivéssemos tido mais um pouco de Amy Winehouse. Ou não.
Recomendo assistir ao documentário, se você tiver interesse e paciência. Se não, recomendo abrir uma playlist com as músicas dela e ir acompanhando as letras. É bem forte, mas acredito que valha à pena. (Ah, e pra quem tiver interesse, meu amigo André fez uma análise da matéria que a Rolling Stone escreveu sobre a morte da Amy no TCC dele. Vale a leitura e é só clicar aqui! Para pular as partes mais teóricas e jornalísticas é só começar a ler à partir do item 4!)